A Órigo Energia concluiu uma emissão de R$ 215 milhões em debêntures incentivadas, com remuneração de IPCA +9,24% ao ano, prazo de 14,5 anos e vencimento em março de 2040.

A emissão acontece em um ambiente de juros ainda elevados e apetite mais criterioso dos investidores por risco, mesmo para uma debênture com incentivo fiscal.

Com certificação verde pela Climate Bonds Initiative, a operação foi coordenada pelo Bradesco BBI e servirá para o refinanciamento de 28 fazendas solares já operacionais, que somam 47,1 MWp (megawatt pico, uma unidade de medida da potência usada especificamente para sistemas fotovoltaicos) no Sudeste e no Centro-Oeste do País.

“Entramos em uma fase em que eficiência, organização e rentabilidade passam a ser tão importantes quanto escala”, diz Aurelio Oliveira, CEO da Órigo Energia, ao NeoFeed.

No último balanço publicado, referente a 2024, a empresa ainda estava queimando caixa. A Órigo reportou um prejuízo de R$ 349,3 milhões no período, um pouco acima dos R$ 320,3 milhões de 2023. O Ebitda acumulado foi negativo em R$ 15,3 milhões, ante R$ 36,1 milhões no ano anterior.

Em um momento de transição do setor de geração distribuída (GD) no Brasil, essa captação marca o movimento de reperfilamento da dívida da Órigo, que busca organizar a sua estrutura de capital após um ciclo de crescimento acelerado.

A companhia que atua no setor de geração distribuída de energia solar chegou a comunicar ao mercado um pipeline que poderia levá-la à faixa de 700 megawatt (MW) a 800 MW. A nova meta é mais conservadora: manter a companhia entre 600 MW e 650 MW, priorizando rentabilidade e eficiência operacional.

Market share pelo market share não paga conta. Crescer sem organização cobra um preço depois”, diz o executivo, que tem duas décadas no setor elétrico e assumiu o comando da companhia em setembro de 2025. A empresa encerra o ano adicionando cerca de 250 MW em capacidade instalada, um ritmo que, agora, será reduzido.

No fim do primeiro semestre de 2024, a Órigo havia realizado a emissão de R$ 500 milhões em notas comerciais, em uma operação financeira liderada pelo banco Santander. Os recursos foram utilizados para a construção de 149 fazendas solares em 12 estados do Brasil, com potência instalada de 198 MWp.

Um setor em transformação

O movimento da Órigo reflete uma mudança mais ampla no setor de GD, que deixa para trás a fase de crescimento quase automático impulsionado por incentivos regulatórios e passa a conviver com maior escrutínio financeiro.

De acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar), 2026 deve marcar o segundo ano de redução do setor. Em 2025, foram adicionados 11,4 gigawatt GW de potência instalada da fonte solar, ante 15 GW adicionados. No próximo ano, a projeção é de 10,6 GW.

Com isso, a expectativa da Absolar é de uma retração de investimentos de R$ 40 bilhões neste ano para R$ 31,8 bilhões em 2026.

Na avaliação do CEO da Órigo, a GD precisa evoluir de um modelo centrado exclusivamente no desconto na conta de luz para uma proposta mais sofisticada, que incorpore gestão de consumo, eficiência energética, previsibilidade tarifária e, no futuro, armazenamento de energia.

A GD é um modelo que pode gerar ganhos sistêmicos para o setor elétrico. Ao produzir energia próxima ao consumo, a geração distribuída reduz perdas técnicas - hoje estimadas entre 6% e 8% nas tarifas - e alivia gargalos de transmissão, benefícios que ainda não são plenamente capturados economicamente.

“A GD não é só um produto comercial. Ela tem um papel estrutural no sistema elétrico, mas isso ainda precisa ser melhor reconhecido”, diz Oliveira.

A Órigo tem como principais acionistas a I Squared Capital, gestora norte-americana de private equity, com quase 49,4% das ações, e a também americana Augment Infrastructure, gestora de fundo de investimento focado em energia renovável e infraestrutura sustentável, com pouco mais de 23%.

Relacionados

A grande contradição: setor elétrico vive choque entre expansão acelerada e gargalos de infraestrutura

Brasil desperdiça "duas Belo Monte" de energia em outubro. Solução só a partir de 2030

Energia elétrica de pequenas usinas vive “curto-circuito” na estratégia de obter grandes retornos